domingo, 15 de agosto de 2010

"Não é possível se conformar com essa inversão de valores"



Pelo bem desta Fronteira


Em 12 de fevereiro de 2000 publiquei uma crônica em A Platéia com o tema da ocupação da nossa linha divisória, que não se alterou. Nada se fez, e nem se cogita uma solução para o problema. Só resta repisar o que escrevi, porque aquelas palavras continuam atualíssimas.

Sou santanense, nasci aqui e por aqui me transformarei em pó. Como tantos outros naturais desta sesmaria amamos a estas paragens, não obstante este clima de deserto, quando a temperatura pode bater os 40ºC no verão e cair a 2ºC negativos no inverno, sem mencionar este vento Sul que não perdoa todo o ano. Apesar de tudo, sempre são dadas boas razões para viver neste lugar. Se não fosse assim, o nosso espírito de aragano iria nos conduzir para outras querências.

Isto não significa que esteja satisfeito com tudo o que acontece por aqui. Há situações que precisamos execrar. Entre estes casos está aquele amontoado de pessoas e seus pertences que tomaram conta e se implantaram compulsoriamente na Praça Flores da Cunha ou a dos Cachorros, impedindo o trânsito normal de pedestres entre Livramento e Rivera pelas duas principais ruas. O que é aquilo, meu Deus?

Sei perfeitamente que o trabalho informal, não só no Brasil como em qualquer outro país, é o que mais vem crescendo em todos os quadrantes. Em face de tal circunstância é preciso que a comunidade reserve os meios e os espaços necessários para que toda pessoa com tal atividade possa ter condições de desenvolver o seu trabalho. Afinal, todos precisam sobreviver com o seu labor honesto e produtivo.

O que não é possível, é conformar-se com a situação pela qual uma ou duas centenas de pessoas tomaram conta da passagem central de ambas as cidades e criaram uma república independente no território limítrofe de ambos os países, pois até construíram cubículos cobertos com telhas de zinco, o que descaracteriza a condição de ambulantes daqueles camelôs. Ali, os transeuntes entre a Avenida Sarandi, em Rivera e o Largo Hugolino Andrade, em Livramento, estão obrigados a caminharem pelo meio dos automóveis ao longo da rua. O mesmo também acontece entre a Rivadávia e a Agraciada.

O que se constata de tudo isto, é que houve uma inversão de valores sociais. Observa-se que uma minoria, que não deve ultrapassar a 200 pessoas, com a justificativa de que precisam trabalhar se impuseram aos interesses da população de ambas as cidades que ronda os 180 mil habitantes. Ainda é preciso lembrar, que nos últimos tempos, a população flutuante que visita esta fronteira diariamente e que atinge a algumas milhares de pessoas também se deparam com este anacronismo. Será que alguém de bom senso está de acordo com esta situação?

Há mais de 20 anos passados esteve aqui, visitando os seus parentes, o sr. Trajano Ribeiro, santanense, que ocupava a Secretaria de Turismo do estado do Rio de Janeiro. Na ocasião, fez uma palestra na Associação Comercial e se comprometeu a mandar um técnico em turismo da sua secretaria, a fim de ajudar o nosso desenvolvimento naquela área. O técnico veio, e foi levado para conhecer a todos os pontos turísticos das duas cidades, para que pudesse fazer uma análise e oferecer sugestões das potencialidades locais.

Naquela ocasião, a Intendência de Rivera estava instalando o camelódromo do lado uruguaio e, provisoriamente, eles estavam cobertos com uma lona preta. A imagem foi a pior possível e o técnico nos falou abertamente que não era possível falar em turismo com aquele quadro, e as sugestões foram pelo ralo.

Fazendo um mercado como o de San Telmo, em Buenos Aires; um Tristán Narvaja, em Montevidéu, ou como o Brique da Redenção, em Porto Alegre, estaremos fomentando o trabalho informal e o turismo simultaneamente. O impossível é continuar convivendo com o atual aglomerado naquele ponto estratégico.

Artigo do santanense Renato de Mello Levy, advogado.
Foto: Antigo postal da Praça dos Cachorros, do acervo de Renato de Mello Levy.
Clique na imagem para ampliá-la.

2 comentários:

Anônimo disse...

Ué, para o prefeito wainer eles são empreendedores! onde eles se igualam aos cidadãos que pagam impostos e IPTU, hem prefeito? aliás, você é prefeito de quem? da população ou de 0,000001% de infratores da lei?

Fernando Flores disse...

Falando em Rio de Janeiro, o choque de ordem que existe por lá mostra bem o que é uma cidade voltada ao turismo.
Quando qualquer ambulante está ocupando área que não é para isto, e a polícia chega, vai um para cada lado. Fazem lençóis com arcos nas pontas, e amarram cordas em volta deles, e lá colocam seus "produtos" para que quando vejam a polícia, possam fazer do lençol uma bolsa e sair correndo.
Vi várias vezes isto. Se estão contra a lei, pelo menos sabem que são errados.
Aqui, quem duvida que a polícia toma mate com os camelos? E ajuda a por a "ordem" que eles criaram?