sexta-feira, 17 de setembro de 2010

A falta de visão pública das nossas autoridades



Praça dos Cachorros

Volta e meia, a polêmica retorna, estéril em resultados práticos. O camelódromo da finada praça Flores da Cunha parece que veio para ficar. Faz-se reunião, mesas redonda, o assunto se discute na câmara municipal, entrevistam-se cidadãos, uns contra outros a favor; fulano opina que não se deve erradicar lugar que dá trabalho e renda para tantos, beltrano é do alvitre que o dito encravo é coisa que enfeia a “cidade turística”, coisa que, de resto, só existe na imaginação de alguns. E tudo fica como antes...

Resumindo a questão, falta para resolver o citado busílis, esse “arrepiante” teorema que desafia a argúcia de nossas autoridades municipais nos dois lados da Linha, falta coragem política e discernimento do que seja interesse público. Sobra tibieza e falta tino de administração. E fica a impressão que ambas as administrações têm interesses e compromissos que moram precisamente no interior do território livre da praça dos cachorros. Ou então, alternativa também plausível, chegou-se à conclusão de que tanto riverenses como santanenses deixaram de merecer aquela bonita Praça Flores de Cunha, com suas desaparecidas estatuazinhas de molde renascentista (foto acima), e se devem contentar com uma prosaica praça dos cachorros com seus odores populares substituindo a fragrância de canteiros floridos de antigamente, “coisa de elites” para os luminares que hoje nos governam...

Não se precisa viajar para muito longe e constatar exemplos que desmentem a insolubilidade desse enigma que tanto constrange as forças vivas de ambos os municípios e “tira o sono” de nossos preclaros edis, vereadores, intendentes e prefeitos. Cem quilômetros daqui a municipalidade da cidade de Artigas deu domicílio fixo e condizente, higiênico e bonito aos vendedores ambulantes há poucas quadras do centro urbano. Salto, a segunda cidade do Uruguai, fez coisa semelhante: reservou área medianamente afastada do centro, mas com razoável infra-estrutura para feirantes e camelôs, descongestionando e tornando mais aprazível as quadras centrais, e dando mais visibilidade às belas construções públicas e privadas, muitas ainda do século XIX. E não consta que ambas as comunas tenham sido assoladas por dramáticas epidemias de desemprego e desarranjo social; mais parece ter ocorrido o inverso.

Vê-se, portanto, que outros acharam solução para a dificuldade que tanto “atormenta”  e “paralisa” as cabecinhas desses que nos governam faz tanto tempo. Existem os que, para surpresa de muitos, preferem o cheiro de urina e a promiscuidade de acampamentos improvisados ao despojamento e à salubridade de praças ajardinadas. Gosto não se discute. O camelódromo em questão ainda não chega a tanto; é, contudo, indicador seguro do desleixo e da falta de visão pública das autoridades locais. O acampamento ainda não alcançou fumos de babel incontrolável e indevassável, mas parece que vai pelo caminho.

Enquanto santanenses e riverenses continuarem preferindo determinado tipo de governantes e legisladores a Praça Flores da Cunha permanecerá merecedora do epíteto pitoresco de “praça dos cachorros”.

Artigo do santanense Eri Maia. Publicado originalmente no blog Fronteira da Paz.
Foto do acervo de Gonzalo Viera Azpiroz (via Flickr), pescado do blog Filhos de Santana.

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