quarta-feira, 15 de dezembro de 2010

Práticas de patrimonialismo arcaico continuam atuais em Livramento


É no mínimo intrigante a matéria veiculada ontem pelo jornal A Plateia. Vejam só:

Prefeito agradece apoio de Beto Albuquerque a projetos da cidade.

O deputado federal Beto Albuquerque (PSB) recebeu na tarde desta segunda-feira (12), em seu escritório parlamentar em Porto Alegre, o prefeito de Sant’Ana do Livramento Wainer Machado.
A visita de cortesia, segundo o prefeito, foi para agradecer pessoalmente o parlamentar pelo apoio que vem dando ao município. “Fiz questão de vir aqui agradecer o Beto pela parceria com nossa cidade, em especial pelo asfaltamento da rua Conde de Porto Alegre, viabilizado com recursos do deputado, e pela indicação para que o município recebesse novamente as cestas básicas de Natal doadas pela Legião da Boa Vontade (LBV)”.
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Será que entendemos de forma correta?

O prefeito Wainer foi ao deputado Beto "agradecer pessoalmente o apoio que vem dando ao município [...] viabilizado com recursos do deputado...".

Ou seja, o deputado tem recursos e o está repassando ao município de Livramento. Observem que há um nítido tratamento patrimonialista dos recursos públicos. Certamente, o deputado Beto viabilizou o repasse de alguma emenda parlamentar do Congresso, entretanto, a versão é que o mesmo está ele próprio dando recursos à prefeitura. Uma pessoa mais ingênua ou menos instruída pode muito bem deduzir que o deputado tirou dinheiro do próprio bolso para doar à prefeitura de Livramento. A confusão é proposital.

A literatura histórica e sociológica brasileira é farta no registro de fatos semelhantes. Vários autores renomados estudaram o fenômeno do patrimonialismo na política brasileira. Vou lembrar apenas dois deles: Sérgio Buarque de Hollanda (pai do compositor e escritor Chico Buarque) e o gaúcho Raymundo Faoro, o primeiro com a obra "Raízes do Brasil" e o segundo com a obra "Os Donos do Poder".

O patrimonialismo é a característica de um poder público que não possui distinções entre os limites do público e os limites do privado. Fazem parte de um Brasil pré-republicano, arcaico, e de escassa organização institucional. Quem já ouviu falar ou leu sobre o "mandonismo dos coronéis" no Brasil anterior à revolução de 1930, sabe do que estamos falando.

O prefeito agradece ao deputado como se este - ele próprio - fosse o generoso donatário do recurso, e não o Estado, pelo mecanismo legal da emenda parlamentar. No caso, o agente público, o deputado, acaba personificando o Estado e usurpando os méritos que não são dele, mas do poder público. Essa intencional confusão entre público e privado serve de biombo para que o deputado recolha para si os méritos do Estado. Méritos esses que depois se traduzirão em trocas mútuas de favores, mas sobretudo apoio eleitoral e voto na urna.

Um comentário:

Anônimo disse...

O prefeito sempre tentando personalizar suas (poucas)ações e tentando, sempre, vincular sua imagem a de algum poderoso de plantão, como seu aliado beto. Muito bem Laura, bem informado, afinal para que serve um deputado federal, senão para agir e reveindicar as verbas para seu estado ou para os municipios que o elegem? Nada demais, além de sua funçaõ fez o dep. Beto Albuquerque, muito menos o prefeito, q somente teve o trabalho de assinar a petição.
Fronteiriço